Bem sei que ando um sentimentalão, mas dói a alma ler as crónicas que Miguel Esteves Cardoso (MEC) dedica à sua mulher, gravemente enferma de cancro. Pode aconteccer a qualquer um de nós ou a um dos nossos. O MEC partilha sua privacidade com uma mestria incrivel. O amor existe e é verdadeiro. Digam-me lá o que dizer deste escrito publicado no «Público» de domingo, 29 de Abril:
“Às vezes encontramo-nos com a cabeça nas mãos. Tudo o que poderia
ter corrido bem correu mal. O mundo, que era igual à vida, afasta-se de
repente. Distancia-se e continua a existir, como se nada tivesse a ver
ou a haver connosco, como se fizesse questão de mostrar a independência
dele, mundo, que não existe só porque nos damos conta dele. A má notícia
é má, mas a pior, para quem cá está, é a pessoal. A minha pessoa é a
Maria João e a Maria João passa mal. Nem o amor nem a sabedoria médica a
podem salvar. Só uma conjunção das duas coisas, mais um acrescento de
milagre. O cabrão do cancro alastra-se. Exterminado no pulmão ou na
mama, foge para o cérebro, onde se refugia e cresce. Forma uma força da
morte, aproveitando as barreiras antigas entre o sangue e o cérebro, que
infiltra conforme lhe apetece. Hoje, domingo, é o último dia em que
estaremos juntos, dois amores, felizes há quase vinte anos. Amanhã, logo
às nove da manhã, estaremos na consulta dos excelentes neurocirurgiões
do Hospital de Santa Maria, onde nos avisarão das complicações
possíveis. Obama deveria inspirar-se na perfeição clínica e humana do
serviço de saúde português e francês. Mas a dor não diminui. Nem a
tristeza abranda. Vai morrer o meu amor. Não vai. Como o meu amor por
ela, nunca há-de morrer. As coisas acontecem sem acontecer o pensamento
nelas. A alma, o coração e a cabeça são coisas diferentes. Que se dão
bem. E são amigas. E deixam de ser quando morrem.”
1 comentário:
um BIG HUG para alguém que anda...é...como tu...
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